Os negros da minha vida
* Por Mauro Biazi
* Por Mauro Biazi
Dia da Consciência Negra...data que inventaram pro branco lembrar que existem pessoas de outro tom de pele. Bastaria praticar a consciência humana e não precisaríamos de um dia específico pra homenagear a cor preta/amarela/albina/parda/ruiva.
Diante disso eu me pus a relacionar amigos de cor que andaram comigo na estrada da vida. Não foram poucos e, com todos, a certeza de suas amizades.
Era um tempo sem maldade, ligações sinceras, e a palavra preconceito nem havia no nosso dicionário. Somos de uma geração em que as pessoas de cor eram parte de nossos dias. Tê-los convivendo conosco não nos deixava espaço para preconceituar. E as brincadeiras, quando nominadas pela cor da pele, eram tão despropositadas, tão inocentes e sem fundo algum de maldade.
Início lembrando dos amigos Aguiar e Omar, parceiros dos rachas no campinho da Catedral, e mesmo quando azedava o tempo os palavrões, que porventura tinham eles como alvo, voavam logo depois para longe dali. E tudo era esquecido como o placar da findada peleia. Cidão e a alegria de todo dia.
Nego Milton e Sabará, engraxates da esquina do Bar do Chuinka. O gentleman Caruncho, garçom lenda da cidade, e mais o amigo Sagaz. Ernani Machado, dos tempos do Agrícola, seu pai Jair -cozinheiro da escola- e a dona Anália, mãe dos amigos Leonel e Avelino. O saudoso Guiné, filhos e netos.
O Joãozinho, porteiro do Guará. Vavá, o pintor simpatia. Dona Angélica e aquele sorriso estampado no rosto a vida inteira. Seu Américo dos tempos da engarrafadora do Tio Capa e, logo depois, como nosso senhorio na casa da Rua Tiradentes, 539. Seu Marinho da Loja Jeanne, e família. Neri, Alfaiataria Plaza, que costurou muitas calças minhas.
Anos depois, com mais de 18, ouvindo o Carlinhos soando as cordas de uma guitarra em alguma casa do lupanar. Jairo, alfaiate, irmão do Ernani e amigo desde há muito tempo. Elizeu Freitas, respeitosamente Nego Láio. Gijo e Sapatão, e as glórias do futebol na terra de Guairacá.
Minha madrasta Geni, negra com uma alma linda, e os irmãos Marli, Nerci, Gerci e Zico. Dona Madalena, sua mãe, que mexia aquele virado de feijão que nunca mais provei outro igual, Adelino Waldemar, desde as empresas de sonorização. Tuto, o rei do carnaval, e o filho Josoel.
E, pra encerrar a prosa, a inesquecível lembrança daquele senhorzinho de geada no cabelo, chapéu amassado, que chegava toda manhã com sua pareia de cavalos marchando e despertando os paralelepípedos da preguiçosa Guarapuava dos anos 1960: Nhô Abé, preto de uma luz ímpar, descendente de alguma tribo nobre de Benin, Benguela, Luana, Angola...
Tantos amigos de cor que coloriram minha vida.
(Outras centenas de crônicas como esta no livro Era uma vez...em Guarapuava. Preço: 50,00)
Mauro Biazi
Mauro Xavier Biazi, jornalista/escritor/fotógrafo/promotor de eventos culturais/ gastronômicos, e uma infinidade de outras atividades, usa das palavras para rascunhar recortes de uma vida de tantos feitos e fatos.Deixe seu comentário:
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